domingo, 15 de julho de 2018

Querida Anne M. Frank,

Querida Anne,

Obrigada por teres escrito o teu diário. Sei que no início serviu apenas como um escape aos problemas do dia-a-dia, mas que depois, enquanto estavas escondida no anexo secreto e ouviste o Sr. Bolkestein pela rádio a dizer que seria feita uma coleção de diários e cartas após a Guerra, quiseste partilhar a tua escrita e uma parte tão pessoal de ti com toda a gente.
Confesso que adiei a leitura da tua famosa obra mais de uma década. Lembro-me de estar na biblioteca da minha escola no 5º ou 6º ano e ver o teu livro em destaque. Muita gente falava dele, mas eu sabia que retratava uma das épocas mais negras da história e não tive coragem. Para ti deve parecer algo disparatado: não querer ler um livro. Tu, que encontravas nos livros uma escapatória à realidade e onde aprendias sobre história, mitologia grega e a tua odiada matemática.
Isso para além da "falta de coragem". Eu aos 12 anos não quis ler um livro, quando tu aos 12 anos estavas a passar o último ano da tua vida em liberdade. Já aí falavas das diferenças entre um cidadão judeu e um cristão, mas mesmo assim continuavas a poder ir à escola e estar com os teus amigos.
Foi uma querida amiga minha, que visitou o teu refúgio em Amesterdão, que me emprestou o teu querido diário para, aos 25 anos de idade, lê-lo finalmente.
E como é estranho eu, aos 25 anos de idade, ler os pensamentos de uma adolescente de 13 anos. Somos tão dramáticos e cataclistas nessa idade. É absolutamente normal. Os pensamentos que tiveste sobre os teus colegas serem infantis, sobre os teus pais não te compreenderem e até os pensamentos sobre ti própria e a descoberta do teu corpo e do amor são normais. O que não é normal é teres passado por essa fase da tua vida obrigada a viver todas as horas do teu dia com mais 7 pessoas num espaço pequeno, só porque alguém decidiu que queria exterminar pessoas inocentes.
Lamento tanto, Anne, que não tenhas tido a oportunidade de ter uma melhor amiga com quem falar sobre todas estas coisas, para saberes que não estavas sozinha. Lamento que não tenhas tido a oportunidade de sair à rua e espairecer de cada vez que tinhas um desentendimento com os teus pais. Lamento que tenhas passado as noites e os dias com medo de seres descoberta e levada para um campo de concentração, longe dos que amas.
Deixa-me dizer que o teu talento é ímpar Anne, escrevias mesmo muito bem, principalmente em tão tenra idade. Escreveste "Quero ser útil e levar prazer às pessoas, mesmo àquelas que nunca conheci. Quero continuar a viver depois da minha morte!" e acredita que conseguiste realizar o teu sonho de pequena escritora. Mesmo que não tenhas conseguido sabê-lo em vida.
Agradece ao teu pai - o Pim - que tanto amavas. Foi ele que partilhou este diário com o mundo. Foi ele que possibilitou tocares no coração de tanta gente e deixares a tua marca na história.
Que continues a inspirar a humanidade por muitos muitos anos querida Anne.

Com amor,
Kitty


(Se como eu, andam a adiar a leitura d'O Diário de Anne Frank, deixem de o fazer. Vale mesmo muito a pena, mesmo com a sensação de coração partido a cada página)

8 comentários:

  1. Que carta tão amorosa e sincera :).
    Aos 20 anos de idade, ainda não tive coragem de ler o diário dela. Também o tive na mão aos 13 anos, mas naquela idade ler " A Lua da Joana já me tinha chocado o suficiente. Mas vou ler. Porque a história dela merece ser lida.
    Cada vez que penso nela, fico revoltada. A crueldade do mundo fez com que ela passasse uma fase tão bonita como a adolescência fechada num anexo.
    Beijinhos
    Blog: Life of Cherry

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  2. São belas palavras! Beijinhos, bom domingo :)

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  3. Vou tentar fazer isso...

    Obrigada pela partilha ❤

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  4. A carta está tão amorosa, tão sincera, que é impossível não nos comovermos e ficarmos indiferentes a cada palavra *-*
    Quero lê-lo há anos, mas, estupidamente, fui adiando a leitura. No entanto, este ano comprometi-me a reverter essa situação e já o adquiri!

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  5. Eu li o "Diário de Anne Frank" emprestado quando era adolescente. Aliás devia ter a idade dela. Mais tarde, aos 27, visitei a casa em Amesterdão e quando voltei comprei o livro para o ler outra vez. Ainda não o fiz.
    Beijinhos e obrigada pela lembrança deste livro na minha estante que quero muito reler.

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  6. Esta carta está qualquer coisa, tão sentida!
    É um dos livros que mais quero ler, mas ainda não tive coragem.
    Tenho de o comprar e tratar disso.

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  7. Que lindo e emocionante seu texto Catarina.
    Uma vez na faculdade eu fiz uma pequena pesquisa sobre a prática do "diarismo", essa nossa vontade de escrever sobre nós mesmos em diários ou em blogs (como fazemos hoje).
    Uma das autoras analisadas foi a Anne.
    Mas eu não li o livro na íntegra.
    Quero muito fazê-lo.

    Abraço.

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